segunda-feira, 15 de dezembro de 2014


Numa casa pequenina
escondida na cidade,
no final de pobre rua,
sem asfalto e sem beleza –
falta luz e falta água –
sem fartura de alimento,
uma mãe com seus dois filhos
põe à mesa um simples bolo
e sobre ele uma vela,
que, acesa, ilumina
seis olhos em torno à chama.
Entoam o parabéns
para o aniversariante
e se abraçam, comovidos,
mesmo com festa tão pobre.
Numa casa pequenina
escondida na cidade,
o Menino-Deus entrou
para ali comemorar
a festa do Seu Natal.


NATAL



Nasceu a muitos séculos atrás,
em meio a animais, na estrebaria,
uma criança por Deus enviada
para salvar a humanidade inteira.

Porém, esse sinal do amor de Deus
ainda no ventre de sua mãe
pelo seu povo não foi recebido
e a morte perseguiu-o toda a vida.

Somente os mais pobres de seu povo
souberam acolher esse Menino,
pois em sua pobreza nada tinham
senão a esperança no Senhor.

Pobres pastores naquele Natal
dos campos foram ver o Deus-Menino.
Mas do aconchego das urbanas casas,
não houve que O fosse adorar.

Passados dois milênios desde então,
a humanidade celebra o Natal,
porém nos lares das grandes cidades
o Deus-Menino ainda é rejeitado.

Preocupa-se o povo com presentes,
com roupas novas e u’a ceia farta,
mas no aniversário do Menino,
o pobrezinho não é convidado.

Aguarda-se a ceia e os presentes,
abraços e alegria entre os convivas
e na estrebaria o pobrezinho
só tem por companhia os enjeitados. 

Qual o sentido de fazer-se festa
de aniversário para o Deus-Menino,
se o aniversariante é esquecido
e fica fora, sem ser convidado?

Não te preocupes, ó humanidade,
em preparar uma ostensiva festa,
mas busca, dentro de teu coração,
fazer-te manjedoura p’ro Menino.

Não te preocupes em comprar presentes,
mas reconheça o grande dom de Deus,
que deu-te, e por todas gerações,
o Deus-Menino como mor presente.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014



Quando miro-me no espelho,
vejo, além de meu rosto,
também de meus pais os traços.
E quando atento à voz
que pronuncia a mi’a boca,
ouço meus antepassados.
Tudo aquilo que eu faço
e julguei que era-me próprio,
com o passar da idade
penso ser tudo herdado.
Minha vida é um plágio –
é ela um plágio somente –
de outras vidas que correm,
que correm em minhas veias,
ou que passaram por mim,
permanecendo em meu ser.
O que pensei ser mi’a vida
é um mosaico de vidas.





Eu vivi entre montanhas,
habitando em um vale,
desejando as alturas,
mas sem as subir jamais.

Tudo o que eu vi do mundo
limitou-se ao meu vale.
Até a visão do céu
não levava ao infinito.

Lendo a história de alpinistas,
minha alma chora triste.
Tanto havia além-montanhas,
no entanto eu quedei-me
toda a vida em meu vale.





Quero aprender a morrer,
silenciar esta vida
e sem para trás olhar,
sepultar minha memória.
Cansado estou de viver,
vendo escapar, entre os dedos,
o tempo e os meus sonhos.
Penso que, silenciando
a minha voz nesta vida,
possa encontrar o repouso
e a verdadeira alegria.
Quis aprender a viver,
mas tive mais frustrações
do que alegria na vida
e o corpo, quase sem forças,
pede-me já o descanso.
Ter-me enganado eu creio
ao desejar que o meu nome
vivesse além de mim.
Quero aprender a morrer
e a quietude encontrar.
Quero dobrar meus joelhos
e nos braços achegar-me
de Deus na eternidade,
esquecendo a minha história,
no próprio Deus me perdendo.





Sou o plágio de um poeta
sem talento e sem amores,
incapaz de belos versos,
só cantando as minhas dores.

Mi’a existência é medíocre,
sem amar ou ser amado;
nada deixarei de herança,
ser um nada é meu fado.

Nada mais da vida espero
a não ser a boa morte,
que porá um final ponto
em mi’a vida e sua sorte.



quinta-feira, 4 de dezembro de 2014



Ao longo de mi’a vida vi morrerem
tantas pessoas jovens e amadas,
ceifadas no auge da existência
por quem a mim um dia ceifará.

Sempre pensei que se eu morresse jovem
talvez não encontrasse a paz eterna
por sentir-me frustrado e incompleto
no meu destino traçado por mim.

Por outro lado, houve tantas vidas
que foram, a seu tempo, carne minha
e que ainda vivem, separadas
de mim e hoje estão esquecidas.

Aqueles que a morte separou-nos
marcaram-me profundamente mais
do que os separados pela vida,
vivos permanecendo em mi’a lembrança.

E apesar da dor ainda sinto
quando a morte busca os amados,
se há alguma coisa que lamento
é conviver menos do que devia.

Espero que, quando vier a morte
buscar-me e levar-me ao Mistério,
ao menos deixe marcada uma vida
como a minha foi pelos que amei.





Há dias em que penso que a morte
será a mais bem-vinda companheira
e, entre os seus braços aninhado,
não mais me alcançarão dor e tristeza.

Não sofro apenas por este meu corpo
estar dando sinais de exaustão,
co’a enfermidade aos poucos me prostrando,
tirando-me a alegria de viver.

O que, no mais profundo de mi’alma,
dói-me é perceber a indiferença
do homem em relação ao sofrimento
de outro como se não fossem pares.

O que em mim existe de pior
desperta ante a desumanidade,
e a esperança parece estar morta,
a cinzas reduzida e a mais nada.

No entanto, sob a cinza há uma brasa
que a um sopro volta a crepitar
e a morte, que era então tão desejada,
recua dando espaço para a vida.

                                                                   


Há sonhos que a humanidade tem,
que são os mesmos sonhos do Senhor,
por Deus postos no coração humano,
que espera se tornem realidade.

Eu quero crer que a humanidade um dia
construirá um mundo mais pacífico
e cada um, buscando o bem comum,
expurgará da terra a indiferença.

Enquanto este ideal é utopia,
o egoísmo luta contra o amor,
mas os tênues sinais da caridade
mantêm acesa a chama da esperança.